Tuesday, August 02, 2005

Rápidos garranchos sobre o levar-se muito a sério

Certa vez, quase ao mesmo tempo em que olhei para o céu e vi um cometa passar assobiando (É verdade, os cometas assobiam. Os planetas dançam e as estrelas cantam. Alfa de Centauro é a mais desafinada.), pensei em fechar este blog. Posteriormente, quando coloquei meu espírito para se exercitar a poder de chibatadas, notei que tudo não passava de 2/3 de dor de dente misturada a uma pitada de preguiça de ler.

Ainda que eu nutra uma grande simpatia pelo ideal do antigo e nobre Glauco, segundo o qual temos de ser sempre os primeiros entre todos e nos distiguir de todos os demais, por outro lado acho muito engraçado e vital um inalienável direito dos homens: que a estupidez é um direito nosso.

Usando a linguagem técnica dos filósofos, os homens em geral são atualmente tolos e potencialmente inteligentes. Seria, é claro, imensa presunção de minha parte dizer que o amigo leitor pertence a este ou aquele grupo, afinal de contas, além de eu não te conhecer, você poderia suspeitar que estou puxando teu saco ou desfazendo de ti por esnobismo (que é uma característica vista com maus olhos segundo a chusma, e engraçada segundo alguns). Posso, por outro lado, afirmar que estou no grupo dos homens em geral, principalmente depois de ouvir certos dizeres em certo lugar.

Segundo o fulano, a massa apenas quer saber se não vai enfrentar a fila no banco, se poderá viajar sentada no ônibus e se voltará bem para casa. Parece que o fulano não tem preocupações dessa natureza em vida, sendo então ou puro espírito (qual seja, sem presença física neste mundo) ou deputado. Pela má catadura e pelo que notei ademais, dificilmente poderíamos considerá-lo qualquer um dos dois, ainda que espíritos atuem neste mundo e ainda que não faltem deputados com cara de pamonha passada. Ora, então este fulano é uma daquelas classes de fenômenos que permanecem um mistério para a ciência, mais ou menos como determinados tipos de raios cujos efeitos ninguém entende direito. Quanto a mim, sou um membro da massa, já que, dentre outras preocupações do gênero, quero saber se minha lâmina de barbear está com o fio decente ou qual é o preço do pão nos supermercados. Acrescentemos a isso o fato de que eu digo algo relativo à política de modo equivalente àquela vontade inadiável de fazer pipi, em meio a cobranças de pênaltis em final de campeonato: não é uma coisa que faço porque quero e muito me dá gosto, mas pela violência das circunstâncias. (Adorar jogo de futebol, aliás, preferir um jogo a um debate político é coisa de gente alienada, não é? Também gosto muito de TV, mais uma característica que segundo alguns é de gente com cérebro de esponja.)

Mas estou dizendo tudo isso e dando essa volta toda para dizer que certas coisas a gente faz naturalmente e sem dar atenção neurótica, por mais legais que sejam os resultados. Bach não descuidou dos originais de seus Concertos de Brandenburgo? Aristóteles não legou à posteridade suas obras sem nenhum plano de estudos? Santo Antão (Hm... Não seria melhor Antônio, como certa vez disse Felipe Ortiz, do finado blog Alexandrinas?), segundo meu xará Cassiano, não afirmou que não há prece perfeita se o religioso percebe que ele mesmo está rezando? Então por que nós, pequeninos homens de curta existência, tentamos ensaiar tragédias em coisas tão pequenas quanto um bloguinho, preocupados com n motivos? Isso parece na verdade uma tragicomédia.

Lembremos sempre que a estupidez é um dos direitos dos homens, e que sempre que preocupações existenciais forem os motivos de não escrevermos mais em um blog, na verdade tudo não passa de uma dor de dente e preguicite aguda da cachola. O resto são dragões virulentos e gnomos zombeteiros. E se você, bom leitor, concluir disso tudo que faço apologia da idiotice, dando-me como exemplo vivo, então você estará abusando do teu direito de ser bobo.

No comments: