Sunday, July 23, 2006

Mulheres com quem vale a pena se casar: Selma Blair

Na última sexta-feira passou na Warner Legalmente Loira. O filme era engraçado, mas não vi todo porque calhou que no mesmo horário passava meu tradicional Friday Night Fights. Se o leitor não conhece, é a tradicional noitada de boxe da ESPN de sexta. (Há também o Wednesday Night Fights - ou Miércoles de Combates, dependendo de quem apresenta.) Mas o que me interessou mesmo no filme foi que apareceu uma das moças mais bonitas do mundo. Ela se chama Selma Blair.



Não sei como eu havia me esquecido dela! Vi um filme dela que não me lembro mais qual. Só lembro que ela era uma fumante. Trabalhava acho que numa empresa. Bom, que importa? Ela podia ser até vendedora de caneta no ônibus. Pena que sou duro, porque se dependesse de mim, aqui haveria uma coleção de canetas.

Bom, se o leitor ainda não percebeu, este texto é mais para encher lingüiça. Pois quem lá vai preferir ler um monte de coisas ao invés de ficar olhando para uma das moças mais bonitas do mundo, que é Selma Blair? Compare este post com o de baixo e adivinha qual que mais agrada de cara. E vou colocar agora mais uma foto logo abaixo de uma das moças mais bonitas do mundo, Selma Blair. Você não vai mais esquecer esse nome, não é?




Com essa não vale se casar?





Ok, não resisti. Mais uma aqui ao lado. Só não vale ter inveja, leitora. Admita, tenha bom gosto. Não te esqueça daquela história do belo ter valor trascendental, etc. Ainda mais quando vemos uma das moças mais bonitas do mundo, Selma Blair.

Saturday, July 22, 2006

Senso poético

Nota: O texto é de meados do ano passado, mas eu o reescrevi quase todo hoje.

Em certo post, Ruy Maia Freitas, do ótimo Despoina Damale, disse algo sobre a importância do senso poético. Curiosamente, eu também havia pensado sobre isso, porém em termos um pouco diferentes. Talvez alguém ache até mesmo inusitado o que direi.

Que eu seja cobrado pelo mais empedernido leitor: que raios eu quero dizer? Vou dar um exemplo que parecerá muito, muito idiota, mas não o é – creia em mim. Digamos que eu, ou mesmo você, faça uma troça ingênua sobre determinado assunto, por exemplo o teatro, afirmando que seria menos pior ele não existir a ser cuspido o tempo todo na platéia. Muito bem. Vamos continuar dando asas à imaginação e suponhamos que um sujeito de humor um tanto canhestro, tendo ouvido a troça, resolva logo em seguida explicar passo a passo a grandeza e o esplendor do teatro, cite de cor inclusive a Poética, explique direitinho a história da tragédia, sua relevância para o homem, tudo sem nunca deixar de cobrar exatidão filosofia e quiçá escolástica sobre os conceitos empregados na troça, etc, etc. Ótimo, ninguém duvidaria que quem nos respondesse assim não é uma pessoa de todo mal-informada: quantos seriam aqueles que leram a Poética e algo da escolástica? No entanto, e farei uma comparação com a música, é evidente que houve uma desafinação aqui, porque o que eu – ou você – disse com determinado tipo de espírito, em tom de pura galhofa, o nosso amigo entendeu de outra forma ou não conseguiu manter a conversa no mesmo tom.

Nem discutamos se o sujeito é ou não pedante, ainda que pareça que sim. O problema todo é a maneira com que o nosso caro e suposto amigo encarou a circunstância. Mesmo tendo razão e mesmo tendo o direito de cobrar maiores explicações, o fato é que a situação não exigia de maneira alguma tal tipo de postura. Não sei se o que quero dizer ficará mais claro ou obscuro com a analogia que direi a seguir, mas é como se ele exigisse uma visão escolástica de uma intuição mística, o que seria absurdo. Claro que aqui no exemplo nem há mística ou escolástica, mas fazer cobranças desse tipo naquela circunstância é falta de senso poético. A resposta correta deveria vir mais ou menos na mesma clave. É como se cobrássemos – mais uma analogia – de alguém que contou para a gente uma piada de judeu exatidões filosófico-históricas a fim de provar que a piada não faz jus aos judeus.

Encarar as coisas sem o menor espírito desportivo - espécie de variante do senso poético – é uma característica de duas classes de seres: os animais e os loucos. Sim, os animais, porque afinal de contas alguém já viu um animal irônico ou, fazendo aqui uma concessão a um leitor louco o suficiente para ainda teimar, pelo menos irônico de propósito? Quanto aos loucos, não é difícil entender o motivo: eles encaram tudo de maneira racional demais, colocam a razão acima de tudo, o que naturalmente leva qualquer um à demência. Já dizia Chesterton: O doido é o homem que perdeu tudo, exceto a razão. Alguém lelé da cuca necessita de uma explicação sumamente racional para tudo justamente porque perdeu todo o senso poético do mundo. É sempre assim: começa elogiando até o exagero a ciência e a razão, depois não entende mais as razões das pessoas darem um simples “bom dia” umas às outras, acaba acreditando piamente em toda uma série de disparates (apoiados no que ele chama de ciência), até que, no fim, caso ele seja coerente consigo mesmo, termine seus dias num hospício. Daí haver duas classes de loucos: a daqueles que de fato vão parar no hospício achando que vivem no passado, em outro planeta e demais coisas intrigantes do gênero, e a de alguns intelectuais. A diferença de um doido que está no hospício e alguns intelectuais é que estes não têm coragem de levar suas idéias até as últimas conseqüências. Mas vez ou outra aparece algum mais corajoso e que vira lenda. O exemplo que me vem à mente é o de Empédocles. Segundo uma anedota, após ter salvado os selinúncios de uma grave peste, Empédocles, durante um banquete em comemoração do fim daquela desgraça, foi honrado pelos habitantes da cidade como se fosse um deus. O sábio então teve a esdrúxula idéia de comprovar a opinião dos selinúncios jogando-se dentro de um vulcão ali próximo, o famoso Etna. Segundo alguns, o vulcão logo em seguida cuspiu uma de suas sandálias de bronze que ele costumava calçar. Bom, se dermos crédito à história, temos um belo exemplo de uma falta completa de senso poético, embora o cronista desconhecido tenha introduzido o elemento faltante na conclusão do episódio, ressaltando ainda mais o caso insólito. A falta de senso poético do filósofo fica então compensada com a ironia do cronista. O pobre Empédocles levou toda a história a ferro e fogo, até literalmente no caso do fogo e menos literalmente em relação ao bronze. Mas longe de ele ser um caso isolado dentre os intelectuais que embirutaram. Há pelo menos cerca de trezentos anos parece que alguém resolveu deixar que os loucos publicassem fartamente suas “reflexões”, muito embora, a bem da verdade, eu tenha de admitir que a loucura pareça rondar a vida de qualquer intelectual desavisado.

Um dos mais curiosos e badalados subtipos de intelectuais loucos é o cético materialista. Este de fato não consegue nem mesmo entender como é possível gostar de um poema, isso quando pelo menos o compreende ou imagina compreendê-lo. Note o leitor que não me refiro simplesmente àquele pasmo inicial daquele que ignora algo que de repente aparece na sua frente. Me refiro ao sujeito que só acha que algo está cabalmente explicado quando demonstrado quase de modo físico-matemático, científico. O louco que escolho para ilustrar este exemplo é Karl Marx. Dizem que ele gostava bastante de literatura, em especial a Ilíada. Mas vejam só que coisa curiosa. Ele ficava se perguntando como era possível gostar tanto de um poema feito num modo de produção tão diverso do seu. Santo Cristo! Ele tinha que encaixar o bendito livro que tanto gostava em seu modo de conceber o mundo mas simplesmente não conseguia. Se os fatos contradizem minhas teorias, pior para os fatos, já disse um outro intelectual tantã. Tivesse Marx pensado suficientemente bem apenas sobre este pequeno exemplo e talvez nunca mais viesse com aquelas histórias sobre a cultura ser uma espécie de vestimenta enganadora de uma realidade mais profunda, a saber, a senhora economia e a luta de classes. E não faltam pessoas que raciocinam mais ou menos por este esquema, o qual muitos chamam de “científico” (lembremos mais uma vez daquela frase, “o doido é o homem que perdeu tudo, exceto a razão”): gente que acha que os genes, o sexo, a linguagem e demais excentricidades explicam absolutamente tudo da vida humana. Sim, excentricidades, termo muito próprio, porque tais coisas, embora façam parte de nós, não são de modo algum a gente; é como se vivêssemos através delas, ou mediante elas, embora em última instância sejamos anteriores a elas, que são só a nossa roupagem: são a nossa epiderme. Assim, o sujeito é biruta porque pensa que a nossa vida é tão somente o superficial. Mas a realidade, como não poderia deixar de ser, se apresenta lotada de apesares. Quando o indivíduo é confrontado com eles (os apesares teimam em aparecer), ele então sobe no caixotinho escrito Raison, bate no peito estufado e diz, todo categórico: “Eles não existem! Eles não existem! Vocês estão todos loucos! Loucos!”

O mundo do doido, embora pareça ser todo bem-amarradinho, todo explicadinho, é de um brutal desleixo. Tudo, tudo que é muito bem explicado só o é porque deixou alguma coisa de fora. A simplicidade se faz às custas dos elementos indesejados. É verdade que a ciência opera mais ou menos assim, porém há sempre um limite claro. O físico sabe (ou deveria saber) que seu afazer, embora nobre e valiosíssimo, não esgota todas as possibilidades da realidade. O que não está na alçada da Física, que outra ciência busque explicar. E assim por diante. Acontece que o doido é por natureza destemperado. Então vai andar por cima de tudo como um rolo compressor. Se algo não se encaixa em seu mundo, então é porque não presta. O cético materialista sempre passa uma sensação enorme de aridez mental, de uma pobreza franciscana tremenda, mesmo sendo aparentemente um sujeito bem-informado e instruído. Na verdade, parece demais com um daqueles sujeitos pobres e muito mal-educados que de repente ganha dinheiro demais: com toda a riqueza à sua volta, continua grosseirão em essência.

Essa situação, justamente por ser tão errônea, nos leva a um paradoxo dos mais inusitados. É que o doido, quando corajoso, quando finalmente percebe que não consegue explicar tudo conforme a Senhora Razão, acaba acreditando piamente que este mundo é, em suma, irracional. É o caminho mais natural da “razão embirutada”. Ela começou crendo demais em si mesma e acabou perdendo o juízo e atribuindo os seus próprios disparates à própria natureza do mundo. Em face disso, surge toda uma filosofia que bem mais merecia ser chamada de antifilosofia. É o niilismo final. Nada mais faz sentido, não existe verdade, nem você é quem você é ou o que você pensa foi você mesmo quem pensou. Racionalmente você descobre que não existe razão coisa nenhuma. Uma antifilosofia desse tipo pode ter várias repercussões. Ora ela pode ser encarada de modo desesperado (ou destemperado, que o leitor escolha)– aí estão os suicidas para confirmar –, ora ela pode ser encarada de maneira resignada, com algum resquício estóico que todo o sujeito sentimental geralmente possui. Independente da posição tomada, o dado é este: o mundo é trágico. É por este motivo que imagino ser difícil encontrar um cético realmente bem-humorado. Se ri, é um riso nervoso, quase de desespero. Vive, ou melhor, sobrevive. Ele é como uma árvore seca, pois o senso poético é a seiva o que nos vivifica.

É por este motivo que, ao ouvirmos de alguém cheio de sentimento trágico, que o mundo é uma piada, devemos logo em seguida concordar e até agradecer pela pessoa ter dito tão sábia coisa. Porque apenas um ser dotado de muito bom-humor poderia criar coisas tão belas e boas. E se tudo for fundamentalmente um bem e for bom, então mais um motivo para isso tudo ser uma bela e espirituosa piada, porque tudo o que termina bem é uma comédia. Entre um mundo trágico, onde tudo é marcado pelo mal, e um mundo cômico, onde você pode se divertir porque as coisas são boas e terminam bem, há uma larga diferença. Peço inclusive ao leitor, caso tenha achado estranho o que eu acabei de dizer, que puxe pela memória acontecimentos que pareciam ruins, bem ruins, mas terminaram bem em sua própria vida. Hoje você não consegue até achar graça deles? Contudo, imagine agora se eles terminassem de fato mal: ninguém, ou melhor, nenhuma pessoa de bom-gosto costuma fazer piadas de morte de gente querida. Acho até que foi Machado de Assis que disse ser isso, a morte, um assunto sério por excelência. Mas voltando àquele ponto de vista sobre o fino humor que sutilmente marca este mundo, ele só pode ser percebido por quem possua uma visão poética da realidade, pois do contrário exigirá, como o chato que nunca entende uma piada, explicações pormenorizadas e por fim inúteis de algo que você deveria entender antes pelo espírito da coisa. Daí que uma pessoa inteligente é sempre, e antes de tudo, espirituosa. E o que mais uma pessoa assim faz senão instintivamente dar as mais sábias, curiosas e devidas respostas nos momentos mais inusitados possíveis? Isso porque uma pessoa espirituosa entende bem sua situação e seu momento: é o tal do senso de timing. E seus ditos podem ganhar tanta fama que, esquecido o sujeito que os proferiu, ainda assim eles continuam sendo usados por quem nunca o viu mais gordo e em épocas nunca dantes imaginadas, como é o caso dos provérbios, armazém do senso comum. Ser espirituoso é saber encarar a realidade com o devido senso poético, ou seja, uma espécie de sentido que a transcende e aponta como as coisas deveriam ser. Aliás, este é um outro motivo de tanta gente supostamente racional(ista) menosprezar os ditados, outra fonte do senso comum, pois não podem entender o fundo espirituoso subjacente aos mesmos. Quanta sabedoria e verdade não há naquele velho provérbio português que diz: Não há geração sem rameira ou ladrão.

Para evitar qualquer mal-entendido, aviso de uma vez por todas que no parágrafo anterior não gracejei nem do mundo enquanto criação da boa-vontade divina, nem do senso comum, nem fiz abstração descarada da tensão trágica que também existe neste mundo. Quando digo que tudo aquilo é entendido melhor à medida que tenhamos uma visão espirituosa, acrescentando que o bom-humor está subjacente a isso tudo, não quero dizer que tudo está destituído de seriedade ou que não é para ser levado a sério. Neca de pitibiriba. Embora eu não goste muito de me expressar por idéias paradoxais, ao menos não em prosa, eu diria de um modo poético que a realidade é de tal modo séria que nos faz sorrir de satisfação. É justamente sua seriedade e seu peso que acabam nos dando a real medida da alegria. Isso é uma coisa que um cético não vai entender nunca. Sempre lhe parecerá um mistério como pode haver gente que se rejubila por causa do mistério do Deus pregado na cruz.

Enfim, foi pensando mais ou menos nessas coisas que também percebi a importância do senso poético para lidarmos com o mundo. A falta dele faz com que invariavelmente representemos sem querer, também como Ruy M. Freitas comentou a respeito do caso particular de cem freiras marchando junto ao MST até Brasília dia desses, um papel tragicômico no grande palco do mundo. Ficamos naquele meio-termo que só serve para nos denegrir e nos confundir. Começa bem, começa sensato, mas termina muito mal, porque na verdade nem começou bem, nem sensato. Não é à toa que ao mesmo tempo que abundam os céticos, abundam também a loucura e toda a sorte de disparates. Mas não é nada, meu caro leitor, que São Paulo já não apontasse a solução. Porque, segundo ele, onde abunda o pecado, superabunda a graça. A marca da alegria é sempre presente. O Apóstolo tinha mesmo um baita senso poético.

Sunday, July 16, 2006

Prosa filosófica concretista

Meus amigos, vejamos que coisa bonita de se ver. É a prosa filosófica concretista. O segredo é você dizer várias coisas que parecem inteligentes, provocando um sentimento estético apropriado, mas que no fundo não signifique nada ou pouca coisa. E mesmo que tenha algum valor, a forma é mais impressionante. Aqui vai o primeiro exemplo, um clássico do gênero:

Podemos ver claramente que não há nenhuma correspondência biunívoca entre relações significantes lineares ou de arquiestrutura, dependendo do autor, e essa catálise maquínica multirreferencial e multidimensional.

O artista em questão é Félix Guattari - Maguari para o público nacional -, vindo daqui. E não custa perguntar: você viu claramente mesmo?

Agora, mais um outro. Dessa vez é Pierre Bourdieu. Esses franceses pós-década de 60 resolveram criar um idioma próprio, só pode. Eis o mestre:

As condições associadas numa classe particular de condições de existência produzem o habitus, um sistema de disposições duráveis e transferíveis, estruturas estruturadas predispostas a funcionar como estruturas estruturantes, quer dizer, como princípios que geram e organizam práticas e representações que podem ser adaptadas objetivamente aos seus resultados sem pressupor um fim objetivo consciente ou um domínio expresso das operações necessário para o atingir, objetivamente 'regulador' e 'regulado' sem ser de qualquer forma o produto de obediência a regras, e, assim, que pode ser orquestrado coletivamente sem ser o produto da ação organizatória de um maestro.
E eu gostaria muito de fechar com uma citação de Paulo Francis sobre uma professora de literatura a respeito de Dom Casmurro. O texto do Francis se chama Capitu na Universidade. Eu o tinha, mas não sei onde foi parar. Se algum simpático leitor deste blog mo passar, ficarei muito agradecido. E tenham um bom dia.

Saturday, July 01, 2006

Ambiente universitário

Hoje eu estava lembrando do mural do Centro Acadêmico da faculdade. Havia um monte de coisas nele, porém o que mais me chamava atenção era a parte sobre cultura. Não lembro exatamente o que havia escrito ali cotidianamente, mas eu sempre tinha a impressão de que por "cultura" os coordenadores do mural entendiam um amontoado caótico de gostos totalmente doidos que porventura tivessem alguma coisa a ver com política. "Cultura", no caso, era simplesmente um desregramento qualquer apoiado em algo que, em última instância, o justificasse, mas sempre tendo um fim político, ainda que remoto. Até a loucura tem algum método.

Além daquele mural, outra coisa que me chamava a atenção era a mania excessiva de se possuir um trejeito. Era como se o mais importante, a meta almejada na faculdade não fosse o que se estudava, o saber, mas a incorporação de modos. Podia ser o modo de falar, de se vestir, até mesmo de se sentar e de olhar. E o que é mais estranho (ou de se esperar) é que isso ocorria quase naturalmente. De repente você estava todo "universitado", se o leitor me permitir tal expressão tenebrosa. O universitário geralmente se trái. Quando você ouvir alguém dizendo alguma coisa bizarra, como por exemplo "Eu, entrando aqui, será uma fogueira de paradoxos", pode ter certeza que é universitário. Claro que o bizarro admite graus, porém nunca deixa de ser esquisito. Em todo o caso, o camarada podia ser burro feito uma porta, mas ele haveria de conquistar, talvez por osmose, todo um repertório de ademanes que indicariam de onde ele era, quase como se fosse uma nova impressão digital. Isso não deixa de ser um caso interessante de estudo antropológico.

Querem ver um dos rebentos desse estado de coisas? A TVE é um belíssimo exemplo. Com um pouco de prática você é capaz de dizer qual é a universidade, o curso, o período e as notas de cada um daqueles jovens apresentadores, ou mesmo se fazem pós-graduação e qual a tese. Posso até mesmo listar um conjunto de sujeitos mui apreciados pelos nossos simpáticos universitários: Raul (perdão, Raulzito), Francisco Buarque de Hollanda (perdão de novo, é Chico), Marisa Monte, os grandes poetas Caetano Veloso, Renato Russo e Bob Dylan, Sartre, Nietzsche, Bukowski, um poeta de boca meio mole e brasileiro que esqueci o nome mas vive aparecendo na TV dizendo que é beatnick, Paulo Leminsk, talvez algum rock... E tudo isso porque o camarada é culto. Mas ser culto é coisa esnobe. Então ele vai gostar também de coisas do povo, como um sambinha (não qualquer um, senão é esculhambação, tem de ser da época de D. João Charuto) e um pagode ("de raiz", conforme dizem, seja lá o que isso for). É assim que fica o intelectual depois de tomar muito sol na cuca. E há mais coisas. Fiquemos apenas nessas.

A universidade é um enorme centro de recreação e terapia. Vira clube, onde os pais deixam seus pimpolhos. Lá eles fazem cabriola. Porque onde não há regras sobra bagunça. E aí percebemos o que leva esse povo alegre e festeiro a ter uma concepção tão troncha de cultura. Ninguém quer saber de regra nenhuma. Mas façamos aqui uma concessão. Há uma quantidade imensa de sujeitos que poderiam te dizer que gostam deste ou daquele grande escritor, deste ou daquele grande pintor, etc. Pode parecer mesmo que na verdade repudiam aqueles ademanes todos, conservando-os tão-somente como máscara para espantar a multidão de brutos e inconvenientes. Isso por si só já demonstra que a atmosfera ambiente te obriga a tomar uma determinada postura. Agora bem: quantos seriam capazes de sustentar suas opiniões de modo objetivo, racional, acurado, sem temor da multidão? Sabemos que os menos aptos a sobreviver em dado ambiente acabam morrendo ou tendo de procurar outros ares. Não seria diferente nesse caso. A tendência de que haja pessoas capazes dessas coisas vai tendendo perigosamente a zero, e daqui a pouco será uma questão de façanha. Ora, nada mais diverso do que teria de ser um ambiente de intelectuais.

(continua)