Monday, June 23, 2008

Ainda do comportamento feminino

Continuando na clave do meu torpor acerca de determinados comportamentos femininos, eis que ontem, mais uma vez, vivenciei por alguns instantes a incredulidade. Estava eu esperando o elevador, eu, com aparência de mata-mouros, cansado após a peleja dominical, hirto e divagando acerca da lentidão do elevador do meu prédio e de outras maravilhas do mundo moderno, tantos acidentes aristotélicos agindo sobre meu ser, quando de repente eis que apareceu uma garota ao meu lado. Não a encarei, mas obviamente não pude deixar de notar o seu reduzido porte, quase a metade do meu. Contudo, mal o elevador tendo chegado e eu esboçado um movimento para abrir a porta, subitamente aquela criaturazinha me flanqueou da direita para esquerda, num movimento tão rápido que mal pude contemplar, abriu a porta do elevador e tacitamente me convidou a entrar. Não pude deixar de sorrir e dizer um muito obrigado em tom meio zombeteiro.

Aquela criaturazinha foi bastante simpática e adorável quando abriu a porta para mim. Todavia não me julgo tão desprovido de músculos a ponto de exigir semelhante gentileza de alguém que é visivelmente ainda mais fraco que eu. Talvez eu devesse ter presença de espírito e feito questão de abrir a porta do elevador, mas aquela situação me causou tanta surpresa que me senti constrangido a obedecer aquela pequena mulher, o que aliás prova de modo estranho a influência decisiva das mulheres em nossas ações. Bem poderia ser aplicado a elas o dito de Cristo Jesus: "Meu jugo é suave". Desde que a mulher não seja ditatorial, seu domínio consegue ser extremamente sutil e doce. Agora bem: não estou sendo pessimamente agradecido, muito menos desfazendo da gentil garota, mas semelhante inversão é bastante curiosa porque tão natural. Estou mui distante de reclamar dos mimos femininos, porém esse tipo de delicadeza sempre me deixa inquieto. Por mais que estejamos no séc XXI, sob alguns aspectos pertenço ao séc. XIX, ainda que seja interessante dizer ao leitor que não sou exatamente a pessoa mais cavalheiresca do mundo.

Tuesday, June 17, 2008

Das universidades

Se há de fato uma dúvida séria a respeito da qualidade das universidades, acho que a questão deve ser colocada de forma mais ou menos objetiva, embora a sensação de desamparo que muitas vezes os estudantes têm não possa ser negligenciada de maneira nenhuma. Ela tem os seus direitos legítimos no conjunto da análise. Infelizmente não tenho como fornecer uma regra de ouro para tal análise, porém imagino que seria útil averiguar detidamente qual o volume e qualidade -- isto é, a relevância no conjunto dos estudos destinados a cada tema -- da produção acadêmica de cada área, levando-se em conta toda a quantidade de subsídios empregados, tanto em termos financeiros como humanos, ao longo de mais ou menos três décadas, isto, uma geração. Outras universidades ao redor do mundo, de preferência as melhores, deveriam ser comparadas com as nossas nesses mesmos aspectos a fim de fornecer uma base de comparação. Poderia ser interessante também realizar uma comparação entre a produção acadêmica e não-acadêmica, no sentido de checar até que ponto a produção acadêmica em cada área é ou não superior ao que vem sendo produzido fora das universidades.

Apenas para ilustrar em termos o que eu disse, lembro-me que há seis anos a UFRJ tinha dez professores para cada aluno e uma proporção semelhante de funcionários para cada aluno. São números que deveriam indicar uma enorme disponibilidade de recursos humanos, porém não só era comum haver reclamações de falta de professores e funcionários como o problema parecia existir de fato em determinadas áreas. Um dado sobre a USP de quase oito anos atrás é que ela gastava mais de 94% de seus recursos com folha de pagamento, o que aliás não parece ser exceção à regra das estatais, posto que numa palestra que vi de um comandante do exército há muitos anos ele disse que quase 90% do orçamento militar era destinado à folha salarial. Não posso dizer como a situação é atualmente, mas não creio que tenha havido mudanças radicas. Creio igualmente que a situação da USP seja semelhante a de muitíssimas outras universidades estatais. Por fim, embora eu não tenha os números, a quantidade de pós-graduados, ao menos em História na UFRJ, a julgar pela expansão dos programas de pós-graduação que tem havido há algum tempo, vem aumentando bastante. A expansão das universidades privadas indica não só o óbvio aumento na quantidade de graduados como igualmente no de pós-graduados em praticamente todas as áreas. Contudo, a sensação de mendicância acadêmica continua bastante evidente.

Na minha modestíssima opinião, levando-se em conta esses e outros dados, as universidades infelizmente vem se tornando há muitos anos um trombolho cuja finalidade é assegurar uma vida confortável a alguns poucos. É menos pela necessidade de conhecimento que pelo prazer de ter altíssimos privilégios a sua razão de ser. A situação consegue ser ainda mais calamitosa pelo fato de haver, como se tudo isso já não bastasse, o aparelhamento ideológico numa série de cursos. Assim, a universidade acaba servindo principalmente a dois objetivos: assegurar privilégios e propagação de manias ideológicas. A famosa "produção de conhecimento" é relevada à categoria de cereja do bolo. Evidentemente há exceções, o que não deveria causar espanto, pois até em Sodoma havia justos. A questão não é saber se existe vida inteligente nas universidades, mas avaliar até que ponto a propaganda da necessidade de haver universidades, e ainda mais estatais, se tornou uma bela fantasia de cordeiro para disfarçar um lobo cruel e voraz.

Sunday, June 15, 2008

Algo a partir do que D. Lourenço escreveu sobre o Orkut

Mais uma vez, D. Lourenço criticou o Orkut. Quando ele escreveu a sua primeira crítica, senti-me realmente tentado a abandonar o Orkut. Já o tinha feito antes, provavelmente devido àquele motivo lembrado pelo sábio monge: "o vazio dos jovens é tamanho que eles cansam de si mesmos também". Não o abandonei pela segunda vez, mas praticamente as minhas atuações orkutianas se resumiram em combinar os jogos com meu time de pelada, já que é mais prático assim do que telefonar para cada um.

Pois bem, ainda que as minhas palavras tenham algo de hipócrita, posto que sou usuário, meu maior incômodo não é tanto com o Orkut, mas com essa nossa propensão extraordinariamente moderna de publicidade da vida. Ainda não pensei muito bem sobre o tema, mas creio que carregamos de fato um homem-massa escondido no coração. Embora na maior parte das vezes tenhamos opiniões sumamente tolas, sentimos uma estranha necessidade de compartilhá-las, supondo que haja alguma centelha de genialidade escondida nelas. No fundo está a necessidade de exibição de nós mesmos, como se puséssemos a nossa pessoa num estandarte e saíssemos desfilando com ela, por mais tolos que sejamos. Disso resulta, naturalmente, na publicidade de cada aspecto da nossa vida, por mais insignificante que ele seja, como se o mundo não pudesse dar mais uma volta em torno de si mesmo até que o maior número possível de pessoas saiba da nossa existência, supostamente espetacular a ponto de servir como matéria de publicidade. Cada um de nós acaba sendo um exibicionista em potencial, às vezes em grau heróico. Não é nada espantoso que tudo se torne de interesse público, desde as opiniões até os relacionamentos mais íntimos.

Enquanto somos propagandistas de nós mesmos, no campo político surge o Estado policial. Não sei até que ponto existe uma relação de causa e efeito entre ambos, porém a falta daquilo que toscamente chamarei de "consciência real de intimidade" facilita bastante a atuação de qualquer Estado policial. Se nós mesmos nos fichamos gratuita e alegremente, conforme o sucesso do Orkut não deixa mentir, por que o mesmo não poderia ser feito em nome do Estado? O culto a nossa personalidade, esse exibicionismo de si mesmo, pode desembocar, em termos políticos, na mais completa submissão ao poder do Estado. Talvez seja uma conclusão um tanto precipitada, embora mereça alguma atenção.