Wednesday, August 23, 2006

Variados

Meu PC, para variar, está ruim. Vai de novo para o conserto. Portanto, sabe-se lá Deus quando vou escrever aqui de novo. Mas como ele aparentemente me deu hoje uma bela folga, vou aproveitar, muito embora eu saiba do perigo que é cantar vitória antes do tempo.

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O perdão. O leitor já parou para pensar nessa prática admirável? Através do perdão nossos erros são apagados. O pecador se torna inocente. O ódio e o ressentimento se convertem em amor. O inimigo se torna leal companheiro. Tudo, tudo isso através dessa simples idéia: o perdão.

É verdade que se tal é pecado, conseqüentemente tal será a penitência. Se gravíssimo o pecado, pesadíssima a penitência. E isto é belo. Porque não há mal tão grande que não seja passível de cura, exceto um: ter fé na impossibilidade de ter fé. Em outras palavras: ignorar clamorosamente a possibilidade de ser salvo. Ora, o perdão é um excelente indício de nossa liberdade. Negar o perdão é negar a liberdade e o amor. É o pior mal que há, o único que não é passível de perdão, como não poderia deixar de ser.

E eu diria ainda mais. Dizem que fazer um cego enxergar é um milagre. Dizem que trazer à vida um morto também é milagre. Que dizer então de apagar a mancha do erro do espírito? Alguém comete um erro e apenas com perdão e penitência se redime: não é isto admirável? Você se virar para alguém e desculpá-lo, e então realmente a culpa se extinguir, isso tudo não é sublime? Os santos praticam milagres mais vistosos, mas também fomos criados à imagem e semelhança de Deus. Temos algo de santo em nós. E prova disso é justamente isso: praticamos milagres o tempo todo, porque apagamos os erros alheios, enquanto quem apaga os nossos é Deus. E tão natural é essa santidade que nem notamos a sua enorme gravidade. Feliz quem pratica o bem como respira, tão naturalmente que nem percebe.

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Estou noivo!

Se por um acaso o leitor se lembrar, há tempos atrás eu disse que me casaria com a leitora que me desse um livro de Gustavo Corção chamado Dois Amores, Duas Cidades (se fosse um sujeito que mo desse, apenas um aperto de mão bastaria). Pois não é que uma simpática amiga me deu o bendito livro? Sim, esse livro, que procurei em todos os cantos que pude conceber, armado como cavaleiro e lutando contra dragões. Não pude tomar castelos mas também não perdi minhas armas, o que foi, confesso, um resultado bem medíocre. A moça, pelo contrário, com discrição feminina típica, rapidamente o encontrou e generosamente mo ofereceu. Isto prova que as mulheres têm uma capacidade inata de desperdiçar menos energia que nós homens de boa vontade. A mulher é mais prosaica - uma de suas glórias, e que o leitor inteligente, portanto, não interprete mal minhas palavras.

Espero que meus agradecimentos estejam gravados na alma da boa moça - e mais ainda gostaria de agradecer, se possível. Que fiquem eles também registrados aqui no blog. Porém... palavras gravadas no espirito valem mais que em bronze, se é que eu poderia dizer que escrever neste blog é como gravar minhas idéias em bronze.

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Meus amigos, acho que a tragédia da educação é não sabermos nem quais são aqueles primeiros princípios que movem a nossa alma para o saber. Você não saber português, matemática ou biologia é uma coisa. Isto pode ser remediado de uma forma ou de outra. O problema é quando teu espírito não foi bem preparado para que você esteja apto à dedicação do saber.

Se tua alma não foi preparada, dê graças a Deus se pelo teu engenho natural você ainda consiga aprender. Mas antes dê maiores graças a Deus, porque você foi provido de algo raro. Talvez eu pudesse até mesmo dizer que foi um golpe de sorte. E mesmo quem tem engenho natural necessita de exercícios constantes. Ora, eu te pergunto: que exercícios você aprendeu sobre como se deve aprender? Meditação, humildade, solidão, ligação entre o saber e a vida... Até que ponto você aprendeu a respeito dessas coisas? Ser uma pessoa voltada ao estudo não é esse oba-boa de entrar na escola e depois fazer faculdade.

Pensava sobre isso enquanto folheava o Disdacálicon - A arte de ler. Obra de Hugo de São Vítor, antiga de uns 900 anos e atual, pois verdadeira. Disse ele logo na primeira parte que basicamente o estudante precisa saber o que ler, a ordem que se deve ler e, por último, como ler. Mas não só isso. O espírito precisa estar preparado. Então Hugo de São Vítor indica vários preceitos necessários para o estudante, alguns dos quais já citei por alto: Ser humilde, dedicado, bom de memória, dedicado à pesquisa, meditativo, ter boa conduta, etc. São esses alguns dos preceitos para que alguém seja um bom estudante. Talvez seja possível resumi-los não muito erroneamente assim: é uma certa disposição de ânimo que pode (ou não) nos ajudar no estudo.

Nossos estudos estão entre Caríbdes e Cila. De um lado são praticados com fins utilitários. Do outro, para fins políticos. Como então seria possível salvar nossos estudos e conseqüentemente nossas inteligências sem que naufragassem nesse oceano de imposturas?

Pelo que estou vendo, ler Hugo de São Vítor já é um bom caminho.

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Sou atrasado em tudo. Quando comecei a jogar Civilization III, já haviam lançado o seguinte. Quando comecei a ler contos fantásticos, já era burro velho. Justamente agora, quando comecei a me animar em ter um bloguinho, um monte de ótimos blogs foi acabando. E um atrás do outro. Agora foi o caso do César Miranda. Isso é muito ruim. De qualquer modo, foi bom lê-los porque serviu como exemplo de como tem gente boa escrevendo por aí. Do jeito que digo parece até que não sobrou mais ninguém, o que é totalmente falso. Mas parece que muita gente foi tomando desgosto da coisa. Só espero não ser o último marido a saber das escapulidas da minha mulher, embora seja preferível que ela se mantivesse fiel.

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São quase 3h30 e alguém colocou uma música altíssima. Não era ruim, era só meia-boca. A questão é a seguinte: por que nunca ninguém coloca música alta que seja boa? O leitor já reparou que toda a música que colocam para tocar naquelas caixas de som de carro são horríveis? Lembro que foi assim que ouvi pela primeira vez a Eguinha Pocotó. Por que nunca ouvi assim pela primeira vez um quarteto de cordas? Nunca ouvi alguém aos berros recitando Fernando Pessoa no meio da rua. O barulho na verdade apenas indica o quão desprovido de bom-gosto o sujeito é. É como se gritassem que ele é um barnabé com sua aprovação tácita.

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(Dessa vez será meu último arrazoado, prometo. E me despeço por antecipação do leitor, bom dia.)

Dia desses eu estava vendo um filme onde um casal transava. Transar chega a ser eufemismo, porque era uma sacanagem danada que só. Estranhamente, o que me chamou atenção foi o fato de a mulher usar um cordão com uma cruz. Minha primeira reação foi achar aquilo horrível, porque indicava falta de respeito. Pensei depois um pouco melhor. Ainda continuo achando aquilo uma falta de respeito, mas não deixava de ser algo simbólico. São Paulo já disse uma coisa que Homero, se fosse cristão, alcunharia de "palavra alada". O Apóstolo afirmou que onde abunda o pecado, superabunda a graça. Belíssima frase! A cruz no peito da moça me fez lembrar disso. Ainda que pequemos, ainda assim há a possibilidade de perdão. Deus foi crucificado justamente para nos salvar. Portanto, não há erro tão grave que não seja passível de perdão, exceto aquele que já mencionei mais acima. Mesmo naquela cena onde a falta de respeito à religião mais do que sobrava, aquela cruz tão pequenina e que estava servindo de motivo de escárnio poderia servir como ponte para redenção. A marca da salvação estava ali. O problema era ignorá-la. De qualquer forma, a possibilidade da salvação foi oferecida. Mas sou o último a querer repreender alguém. Foi minha excessiva boa vontade que me fez escrever essas coisas, talvez salpicada com um poquinho de sono.

Friday, August 04, 2006

Comentário ligeiro sobre a opinião

Atualmente Israel está em guerra contra o Líbano, conforme aqueles que têm a paciência de ler um desses jornais chatíssimos sabem. E mesmo que você não quisesse saber de nada, acabaria sendo obrigado a ouvir alguma palavra a respeito.

Esse tipo de obrigação é um mal, em certo sentido, pior que a guerra, porque você é tratado feito escravo e retardado.

Mentes esclarecidíssimas acham que temos de saber algo? Então temos de aceitar. E se não quisermos? Bem, se houver resistência, você será forçado ainda mais a saber. Você sabe aquilo que acham que você deve saber, ponto. Essa obrigação é de tal modo bizarra que muitas vezes somos nós mesmos que nos sentimos obrigados a ter uma opinião. Isso lembra aqueles mecanismos de controle de mentes no estilo de 1984. Agora bem: ninguém é obrigado a ter opinião.

Como somos atacados constantemente pelos jornais e suas inúmeras notícias, acabamos nos sentindo, quase intuitivamente, capazes de dizer alguma coisa sobre um assunto qualquer que está a léguas de nosso real interesse e entendimento. Ainda que não houvesse tantas informações em jornais, o simples fato de termos sido alfabetizados nos levaria a ter alguma posição sobre uma série de coisas. O problema é que esse esquema faz com que o sujeito só sirva como retransmissor do que foi dito. É como age o povo. Porque ele é como um sino: quando chocado pelo badalo, repica. É esta uma das características principais do povo, a retransmissão de idéias quando atiçado. Só assim, quando elas estiverem bem espalhadas, haverá como empreendê-las. Todas as loucuras no mundo tiveram início nalgum cômodo gabinete.

A educação, neste esquema, é um paradoxo esquisito. Quanto mais gente passa pelas escolas, maior é o número de gente desinformada. Chegamos então na estranha situação onde uma quantidade inacreditável de gente fala demais sem dizer nada. Suas palavras não têm corpo nem conseguem pisar no chão. É o campo predileto da fantasia, ou melhor, do reino do disparate. Ele surge quando uma quantidade descomunal de pessoas se sente obrigada a dizer alguma coisa sem conexão com os fatos ou com seus próprios interesses. As pessoas falam só por falar, cada um contribuindo com seu quinhão para a poluição de idéias. Nessas circunstâncias, o trabalho de quem quer realmente ter uma opinião sincera, pessoal, se transforma em martírio, porque acaba se vendo obrigado a trabalhar incansavelmente nesse imenso entulho a fim de encontrar uma preciosa pérola.

PS: Quem quiser saber um pouco mais sobre o problema da opinião e da informação, recomendo as seguintes leituras:

1) O Século do Nada, de Gustavo Corção, pp. 119-138 (felizmente podem ser lidas aqui);

2) A Rebelião das Massas, de Ortega y Gasset;

3) a palestra do Prof. Olavo de Carvalho sobre a Educação Liberal.