Fechemos o nariz e entremos nas escolas públicas. Funcionam em prédios abomináveis, projetados por arquitetos de galinheiro a soldo de políticos analfabetos.
Por exemplo, o sofrido e sofrível professor de português. Não ensina mais gramática e literatura. Como ensinar o que não sabe? Ele e seus colegas nunca aprenderam gramática ou literatura, pois estudaram nas piores universidades do mundo, públicas ou privadas — todas muito bem privadas, naquele sentido fétido da coisa.
O vestibular, nas humanidades, não existe mais para premiar o aluno competente, mas para sustentar um negócio da China que começa nos livros didáticos da escola básica e média, passa bem passado pelos cursinhos e termina em gran finale nas próprias universidades.
Selecionar os melhores é elitismo malvado, covardia de bichão-papão. É dever do professor universitário dar as mãos aos desafortunados da sociedade ou da natureza e erguê-los até o próprio nível — o que, aliás, não é muito difícil. Encolhe, cada vez mais, a diferença de conhecimento que sempre houve entre aluno e professor. Nunca um doutoramento foi tão fácil como no Brasil depois da ditadura militar (que teve o honroso mérito de começar a massificação do ensino, brilhantemente continuada pela esquerda peemedebista, peessedebista e petista, que no fundo não passam de farinha do mesmo saco).
Gramática virou sinônimo de torpe repressão burguesa, embora não se usem mais essas palavras do velho e carunchado comunismo. Gramsci ensinou a esquerda a ser mais sutil... A própria Escola de Frankfurt teria um vocabulário mais light para repetir a mesma idéia. Literatura, sobretudo a boa, é disfarce ideológico (no sentido marxista da palavra) — blablablá de intelectuais pequenos burgueses a serviço das classes dominantes. Bom escritor é quem usa linguagem coloquial, em sadia identificação com as massas oprimidas pelo açúcar e o colesterol. Ou quem não usa linguagem alguma, como os concretistas e os minimalistas.
Com a bunda confortavelmente sentada na poltrona multiculturalista, jurando serem iguais todas as culturas e terem o mesmo direito à luz do sol pedagógico — niilismo caridoso —, a inteligência iletrada escreve livros didáticos para aprimorar nos alunos a idéia, mil vezes engolida na tevê, de que uma letra boçal de rap é igual ou superior a um soneto de Camões.
Para usar a linguagem dessa gente: querem excluir a literatura do currículo e incluir o lixo da mídia, expresso segundo a doce cartilha do politicamente correto. Para agradar o aluno, difunde-se todo tipo de besteira, universalmente reduzida a texto. Hoje, tudo é texto. No mesmo nível estão o artigo de jornal, a bula de remédio, a receita de bolo, a letra do Chico e o conto de Machado. O que importa é “ler o texto do mundo”, palavra de ordem dos cursos de letras, propagada no incompreensível dialeto acadêmico pela imbecilidade semiótica, de braço-dado com as sobras requentadas do marxismo ressentido.
Só um Deus pode nos salvar, diria Heidegger. Ou um dilúvio. De preferência, com água sanitária.
(Texto de José Carlos Zamboni, do dia 30 de janeiro. Tem muito texto interessante sobre literatura por lá, visitem, visitem)
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