Monday, February 27, 2006

A política

A política é algo estranho. Parece que quanto mais presente ela estiver numa comunidade, quer dizer, quanto mais precisamos dela, tanto mais anormais estão as coisas.

O ideal é não termos de recorrer à política, ou pelo menos não tanto. Ela é apenas uma espécie de técnica - isto mesmo, técnica - para que seja possível viver bem em comunidade - e só. Nesse sentido, sua "manutenção" é mínima, até mesmo um tanto prosaica. Claro, muitas pessoas podem ter muitas idéias sobre o que é viver bem e como tornar isso possível. Contudo, todas elas precisam ter como pressuposto que as leis têm de ser tão genéricas quanto possível e que garantam que não haja empecilhos para que a sociedade funcione por si mesma. Digo isso porque tenho o seguinte pressuposto: que a sociedade por si mesmo funciona bem, mas às vezes é necessário dar uns retoques aqui e ali. Em casos mais extremos, que por isso são completamente excepcionais, aí sim podemos dedicar bastante energia a fim de sanar o problema, mas só enquanto houver tal necessidade.

Quando os homens se reúnem para fazer política, naturalmente há discordâncias sobre o que se deve fazer ou não, o que é mais necessário, etc, e assim principiam os partidos. No entanto, findados os objetivos, dissipa-se o partido, que já não teria mais razão de ser. Isso aconteceu durante toda a história. Todavia, o que torna a nossa época particularmente estranhíssima do ponto de vista político é que agora os partidos permanecem por si mesmos, a despeito do tempo de existência e do que fazem. Eles mesmos se tornam a razão de seu próprio existir. Isso é tão arraigado que ninguém nem cogita a possibilidade de desfazer um partido após algum tempo: pelo contrário, não é o partido que nos serve, mas a gente é que serve ao partido. Esta é uma perversão.

A existência do partido fica então condicionada a uma situação problemática e insolúvel, porque na verdade os partidos acabam existindo cada vez mais em função de si mesmos e menos para resolver o que tinham de resolver. Daí que a politização da sociedade seja uma tendência. E se a sociedade inteira se politiza, então o próprio partido vai sendo encarado num sentido falsamente profundo, onde ele encarnaria de algum modo o que há de mais essencial no homem (ou até mesmo na realidade). Ele passa a ter um fundamento metafísico. Foi graças a isso que surgiram partidos como o comunista e o nazista, e talvez surja coisa pior no futuro. E coisas assim são a maior perversão da política.

É preciso então reorganizar a hierarquia das coisas, pondo a política em seu devido lugar. Mas despolitizar numa época tão politizada não será tarefa fácil.

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