Saturday, April 28, 2007

Observação sobre um texto de Julio Lemos

Em seu blog, Julio Lemos, lá numa das partes do texto Je ne Comprends pas les Gens qui Essaient de Sonner Comme en 1974, disse assim:

Uma das dádivas da temperança é poder fazer o que se quer – esse aliás é o núcleo duro das virtudes cardeais. Quem pode rejeitar um trago a mais, acordar cedo e deixar certas manias estranhas mas atraentes pode, mais tarde, ter a liberdade de pelo menos tentar conquistar uma mulher valiosa.O que acontece é que o cara pensa que é livre até se ver diante de uma mulher desse tipo ou de um ‘sistema de crenças’ coerente e exigente. Ele percebe que não [está] livre para aderir a um objeto desses. A preguiça e a sensualidade o escravizam: o máximo que ele consegue fazer é ficar em casa no sábado à noite escrevendo textos no estilo James Joyce recheado de referências eruditas e pornografia barata.Diante do desafio de merecer algo superior a ele, com a condição de abandonar antigos hábitos, o cara acaba por desistir. Orgulhoso (vai saber de que), desqualifica os valores mais exigentes – a mulher perfeita e sei lá, o “serviço aos outros” –, dizendo que não passam de ideologias cristãs ou mocinhas recalcadas. É a conhecida fábula da raposa e das uvas. Não podendo alcançá-las, o faceiro raposinho desiste, arranjando uma desculpa: “estavam verdes


Concordo com tudo, exceto com a conclusão a partir da famosa fábula. Não é sob um pretexto qualquer que os valores têm sido jogados para escanteio. Aliás, se fosse por isso, não haveria a mínima diferença entre a negação dos valores hoje em dia e a atitude de um covarde há 2400 anos. Acontece que a diferença é radical. O problema não é simplesmente decorrente de um caráter dúbio, mas da completa inversão dos valores. A raposa, quando dizia que as uvas estavam verdes, continuava sabendo que as uvas verdes eram inferiores. Ela ainda buscava as melhores, mas devido ao seu fracasso lançou mão dessa desculpa. De qualquer modo, sua escala de valores , no fundo, permanecia intacta. Essa atitude é comum. Hoje em dia o problema é outro. Porque se persegue as uvas verdes exatamente por serem verdes. Elas assumiram um valor em si superior que antes não havia, enquanto as uvas maduras, por serem maduras, são identificadas como de tipo inferior. Não é, repito, simplesmente uma questão de falta de capacidade, mas de reviravolta radical dos valores. O fundo dessa atitude é o ressentimento. Daí esse caráter equívoco das pessoas que pregam essas novas atitudes: parecem ao mesmo tempo profundamente insolentes e covardes. A cada afirmação de superioridade o fundo insubornável demonstra imediatamente a sua farsa. Daí a atitude autoritária que essas pessoas têm a fim de impor pela vontade aquilo que não são de fato. Daí que o líder de movimento negro e o militante gay andem de mãos dadas com Hitler e Stálin.

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